Afrokillerz: “Nós somos rappers mas de afro-house” [ENTREVISTA]



Hugo, mais conhecido por Safari, sempre teve vontade de criar. Começou pela produção com pequenos materiais que ia comprando ou emprestando no bairro. Um remix aqui, outro remix acolá, ora acelerava o tempo das bpm’s (batidas por minuto) ora diminuía e depois mostrava aos amigos e à mãe para ver se gostavam da música que tinha criado. Era o artista da casa e da rua.

“Sempre tive essa veia artista, sempre fui diferente no meu bairro”

Landim ou Lands, é como é tratado o Gerson. Sempre teve o bichinho da música e já lidava com outros DJs no seu bairro. Começou a tocar em casa e para as festas dos seus amigos, ia aprendendo a controlar o tempo das músicas e como fazer as passagens sem fazer confusão para quem estivesse a ouvir e a dançar.

“Comecei a tocar como DJ nas discotecas Loft e ABS, para betinhos e quem quisesse ouvir”

Ambos sentiam que faltava algo nas suas vidas e no percurso musical. De bairros diferentes, Lands da Portela (periferia lisboeta) e Safari da Apelação, (Lisboa), ambos inspiravam-se em DJs do ghetto, como Dj Marfox e DJ Nervoso. Entre as aulas de português e matématica os dois foram se conhecendo, travando ligações e paixões, além da música. E ainda, em comum tinham um amigo, o Mika, e aí começou a história dos Afrokillerz.
O nome Afrokillerz nunca foi bem aceite pelo Safari, que queria algo mais extravagante. Mas já era tarde para mudanças, pois no início de algumas músicas já se ouvia o nome do grupo e os amigos já os conheciam por esse nome.
Começaram por ser DJs residentes em muitas festas e alguns bares e tocavam de tudo um pouco. Começaram por criar e tocar música house, que era o estilo com que mais se identificavam na altura. Pouco tempo depois, ouviram o “grito de África”. Entusiasmados pelos sons característicos de vários países como Angola, Cabo-Verde, São Tomé, Guiné-Bissau e África do Sul, começaram por criar um som diferente, que ninguém estava à espera de ouvir na noite e nos bairros.
O estilo afro-house é algo que já faz parte da noite lisboeta e do mundo, mas nem sempre foi assim. Os Afrokillerz depararam-se com preconceitos em relação à sua música durante o seu percurso e os primeiros convites para tocar em bares ou discotecas não foi como imaginavam. “No início fomos tocar na discoteca Art em Lisboa, e quando lá chegamos o gerente disse-nos que não podíamos tocar a nossa música lá. Acabamos por não tocar o que nos deixou muito tristes. Como artistas não nos deram a chance de expor a nossa arte e tudo por causa da cor ou etnia”, dizem os djs.
Apesar dessa infelicidade, o grupo manteve-se forte. Entretanto, já só restavam dois elementos, Lands e Safari. Começaram a produzir cada vez mais, lançavam músicas e muitos remix’s de cantores conhecidos mas sempre muito underground, com um toque deles, numa luta constante à procura de reconhecimento.
"Eramos uma cópia de muita gente, mas só com o tempo fomos descobrindo a nossa identidade, porque também vimos o cerco a fechar-se. A as pessoas que vêm de fora para Portugal querem ver algo diferente, algo do qual não estão habituados no paÍs deles, e é isso que nós procuramos fazer."
No estilo de música que agora fazem, foram influenciados pelos pioneiros Black Coffee, Boddhi Satva e Djeff Afrozila, que fazem música para o mundo. O afro-house que se ouve em Portugal é diferente, é apenas um remix com um toque de rap dos Estados Unidos e um bpm mais acelerado. “Nós Afrokillerz tivemos a coragem de fazer aqui algo diferente  do que já se fazia em Portugal.”

A audácia do grupo já lhes rendeu muitos convites e colaborações, como a possibilidade de tocar em vários países entre a Europa e África. Holanda, França, Luxemburgo, Suíça, Guiné-Bissau e Cabo-Verde, só para nomear alguns.
“Os de fora recebem bem muito a nossa música, os de Portugal também, mas já estão mais habituados ao que fazemos”
Uma das inovações dos Afrokillerz foi introduzir nas suas atuações a percussão ao vivo, o que não se vê em Portugal. O bairro foi quem mais influenciou essa novidade, as vivências e o quotidiano.
O facto de verem uma “tia” a vender um peixe assado no bairro ou fritar uma asa de frango para vender, que é algo que não se vê normalmente na cidade, também influencia a música do grupo. “Um vendendor de pizza foi assaltado aqui no bairro, fui para casa a pensar nisso. já tinha uma música pré-feita com a minha namorada (Rita Seidi) mas, de tanto pensar no assalto, acabei por tornar a música muito dark. São essas coisas que influenciam e refletem-se depois no que lançamos”, sublinha Safari.
Safari e Lands confessam que, inicialmente, foi difícil ganhar o apoio do bairro. Primeiro, tiveram reconhecimento fora para depois serem apoiados dentro da zona onde vivem. “Cá dentro já vêem que temos talento. Agora sim já sentimos o verdadeiro apoio… o simples facto de pegarem nas colunas enquanto há um churrasco na rua e passar a nossa música… é o motor.”
Apesar dos conflitos entre bairros, a música tende a quebrar barreiras e tornar um ambiente agitado em calmo. São bem recebidos onde quer que vão, em qualquer bairro em Lisboa. Para fazerem um set, “bebem” de muitos sítios e pessoas, têm vontade de tocar sempre e em todo o lado.
“Nós somos o que somos, somos a realidade que vêem nas nossas redes sociais. Tentamos passar uma boa mensagem para outros bairros, porque nunca vamos deixar de ter uma imagem de bairro, já nos pediram até que tivéssemos mais cuidado com o que mostramos na Internet, como um vídeo a beber com os amigos. É  a nossa realidade, não vamos ocultar isso”, finaliza o grupo.
“Nós nos consideramos rappers, mas de afro-house, transportamos as nossas histórias através da nossa música que não tem palavras mas sim notas”
Já conseguem viver mais da música do que antes. Mas ainda falta alcançar um patamar importante, os dos festivais, e vão apostar agora em colaborações com grandes nomes da música portuguesa e criar algo diferente do que fazem neste momento para atingir todos os públicos sem perder a identidade.
Têm trabalhado com o Dj Caianda, que tem mais anos de experiência na área. Tem sido uma espécie de professor para eles, que os ajudou a entender que a música tem de ter um background e que a imagem é importante para o mundo artístico.
O futuro parece sorridente para os Afrokillerz que estão a preparar o novo álbum, músicas diferentes e  videoclipes.


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